13.7.09

Toque de Midas Inverso

Dizem que não é possível traduzir fielmente aquilo que sentimos. Fernando Pessoa fingia, recriava o sentimento escrevendo-o de forma compreensível. Tudo isso, contudo, é uma teoria que, como todas as outras, contém falhas, exceções. A exceção dessa deu-se em mim - o que não poderia lastimar mais intensamente. Nunca quis fugir à regra e sentir o peso da diferença... Ainda mais em um caso desses. Não, não sou capaz de pôr em palavras fidedignamente aquilo que se passa no meu interior. Sequer almejo fazê-lo; sou recluso e econômico naquilo que digo. Não por ter pouco a dizer, mas por opção. Podemos fazer nossas próprias escolhas, não podemos? Somos "livres" para tanto. Librdade... "Palavra que o sonho humano alimenta", diria Cecília. Sou dos seres que habitam esta terra talvez o mais cativo. E fui preso por ti. Meu pesar é ter compaixão do modo como os gregos a definiam; coloco-me em teu lugar e absorvo tuas dores. De modo literal e nem um pouco poético. Quando tu me tocas, parte daquilo que tu sentes é a mim dirigido de maneira perniciosa. Se tu falas o que sentes, feito esponja absorvo tudo, contrariando a limitação da tradução ignóbil. As iniquidades cometidas contra ti, que te vertem lágrimas, atingem minha face tal qual uma indesejada lufada de vento; fico atônito, aturdido, sem saber o porquê de tanto sofrimento. É minha sina... Por isso, a cada novo clarear do dia, torno-me mais fugidio. Evito-te; sempre volto. Parece que não posso fugir desse vil destino sem sentir males ainda mais agudos; carregarei meu fardo e, enquanto eu respirar, chorarei por ti.

12.7.09

A companheira

Não me apresente à tristeza
Conheço-a desde o nascer dos dias
Enquanto espiava as rodas
De crianças a brincar
Já nesse tempo a melancolia – doce e lancinante
Vestida de fada madrinha
Espreitava-me com ares de cobiça.

As primaveras seguintes trocaram seu traje
Era o vento a me abraçar
A bater na cara sem piedade
Sem receios de lacerar a minha face
Agora sulcada, antes...
Como era?
Os sons ao redor – folhas farfalhantes! – me confundem

No entanto, lembro bem do cheiro
Ah!... a fumaça que pairava no ar
Sufocava ao ver mentes entorpecidas e quietas
Quando minha alma parecia ser a única
Que se agitava, delirante
Por entre toda a bruma
Tinha certeza de que não podiam ver, que dirá sentir.

Em breves momentos de regozijo
Agradecia por poder respirar
E, adolescentemente, punha-me a dispor dos dias.
Era afirmado louco
Com os plátanos outonais
A denunciar passos ébrios
De um misantropo

Já éramos muito próximos então
Ouvíamos juntos os blues
E, vez ou outra, ela arriscou mudar meu curso
E o de minhas lágrimas
Mas quis – desesperadamente – romper nosso laço
O qual descobri demasiadamente sólido
E não havia mais brios para lhe contrariar.

Livrar-me de suas artimanhas...
Sonho acalentado!
Nas noites frias de inverno
Foi a bengala desse velho já pusilânime
Abismal! No breve momento em que aqui me deixou
Foi por castigo – ria do topo a me observar
E agora, sua fantasia final

Ó, flamejante melancolia!
És o verme, minha eterna companhia.

11.7.09

A quantidade de quase orgasmos é infinitamente superior às gozadas plenas. Chego perto, muito perto, mas na hora da entrega final... nada acontece. E então a clássica feição de "para onde foi?!" assalta meu rosto. É claro que tudo isso pouco tem a ver com sexo, mas com vida - não que sexo não seja vida... enfim. Vivo das expectativas que crio e desejo um imenso e inefável gozo. Vejo um texto se desenrolar, e ele até tem bom início e meio. O fim é que é uma porra. Ou melhor, o fim é um grande pinto brochado. Isso não é nojento, nem engraçado - qual o teu problema com as palavras?! Pura melancolia, cara. Não sei o que fazer quando todas as letras já parecem ter esgotado a quantia de permutações frasais. Merda. Saber que não vou gozar e continuar na transa é quase uma tortura. Antes fosse só na escrita... com os textos ainda me entendo. Quero dizer, a frustração se resume ao papel, sacas? Foda é brochar no plano real, cara. É como se... como se a própria vida estivesse na cama comigo e pulasse fora antes de eu terminar. Talvez eu tenha que aprender a ser mais rápido. Não; gosto do contraste da brevidade da vida com as sensações arrastadas, exploradas até o limite, ansiando pelo êxtase final. Provavelmente, a vida é isso mesmo; uma grande transa. E então concluir um orgasmo deve ser, paradoxalmente, brochante. Uma epifania tão enaltecedora que nos petrificaria... Foda-se; manter-me-ei excitado.

Foda mesmo é compartilhar essa linda transa com pessoas constantemente brochadas.

8.7.09

Amor (inco)Mensurável

Ele disse para ela que não poderia oferecer mais nada; era o fim, ela também não aceitaria menos. O que qualquer pessoa sensata pensaria é "caralho, quando começaram a medir sentimentos?!" Bom, qualquer pessoa sensata talvez não; eu pensei, no entanto. É; de sensato tenho pouco. Apenas a lucidez para não me meter em assuntos alheios e por isso só pensei, não lhes disse nada. Mas minha vontade era gritar-lhes que eram cegos. Não viam que o que tinham era o bastante? Mais até do que muitos sonhavam um dia encontrar. Porém, ela ouvira das amigas que ele a procurava pouco e provavelmente tinha medo de se comprometer. E ela precisava mais. Ele ouvira de seus caras que ela era uma neurótica, uma caça-casamentos. Ele queria menos. Ambos os idiotas se queriam, mas não podiam ver. Não lhes era suficiente a boa companhia um do outro e as risadas compartilhadas; arrastaram o relacionamento para o resto do mundo e o efeito foi o esperado. Eu teria avisado se de fato me importasse. Nécios. Um relacionamento deve ser como um segredo... Se perguntam como andam as coisas, um breve "bem" deve bastar para que não lancem o veneno do ceticismo sobre o casal. Ninguém mais acredita no amor, mas insistem em medi-lo; apenas vivê-lo ou é pouco, ou é demais.

7.7.09

Saí do rumo. Arrancaram-me a estrada dos pés e tiveram a petulância de dizer "segue em frente!". Contrariei-lhes por não lhes contrariar; continuei a andar. Gritei, xinguei e expulsei. Depois, fiquei calado, não quis mais sequer pensar, mas não podia silenciar a mente... Nunca pude. Fui guardando o conteúdo só para mim, fui enchendo... Enchi; transbordei. Feito copo d'água. Foi memorável, pingos molhando quem insistia em permanecer seco. Por que não molhar?! Nunca entendi. Sempre me disseram para fazer tudo direitinho, do jeito como eles queriam, que daria tudo certo. Eu os ouvi e agora respondo por isso. Respondo-lhes que não os ouvirei mais; fechei meus ouvidos para tanta bobagem sem signifição. Sem sentido, sem rumo. Se tenho meus pés, não preciso do caminho alheio. Preciso de pouco, na verdade... Mais do que uma garrafa de cerveja, música e poesia? Nunca quis. E não teria dado certo; não deu. Tentei fugir-me e voltei correndo para mim; sôfrego, ansioso pelo espelho. "E quando quis tirar a máscara/estava pegada à cara", disse o Álvaro. Eu, quando o quis, não achei máscara alguma. Talvez eu nunca tenha seguido outros passos que não os meus. Não, nunca segui. Então como esse ar cheira à segunda vez? Como parece que aqui já estive antes e voltei?! Revisito-me...

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